O nosso corpo é a nossa casa

Bright natural dining room nook with vases plates and fruits on the table.

Passamos grande parte do nosso dia, (e afinal grande parte da nossa vida!!), dentro das nossas cabeças. Ficamos presos a pensamentos, preocupações, a antecipações, a especulações, a críticas, julgamentos, a ruminações, fantasias ou muitas vezes estamos só a pensar sobre o que já foi pensado, ou seja, a ruminar… Andamos em piloto automático (ver artigo “A viver em piloto automático”  no link https://conscienciaplena.pt/2019/11/12/tudo-sobre-mindfulness/ ), desligados do que está à nossa volta, do que podemos ver, cheirar, ouvir, sentir, saborear, isto é, desligados da experiência do nosso corpo.

E podemos perguntar: qual é o problema disso? Fantasiar com as próximas férias, ou recordar o jantar romântico do fim de semana passado parece óptimo… e é, sem dúvida!!! O problema é que quando a mente está neste modo automático, ela começa a vaguear e vai de assunto em assunto sem travão. A mente cria ligações inimagináveis entre assuntos, e de repente passa do jantar romântico, para recordações da última relação que também começou bem num jantar romântico, mas acabou tão mal… E, num instante somos invadidos pela tristeza, sentimentos de abandono, e angústia…. quando até começámos por recordar o maravilhoso jantar romântico do último fim de semana…

Pois, a nossa mente tem este enviesamento: produz muito mais pensamentos automáticos negativos do que positivos. Trata-se de um resultado da evolução da nossa espécie que nos deu muito jeito para sobreviver: dar mais “tempo de antena” ao que pode ser perigoso, do que àquilo que corre bem. O que faz sentido em termos evolucionários… e garantiu que a humanidade chegasse até aqui…

Por outro lado, quanto mais experiências associadas a estados emocionais negativos tivermos na nossa história de vida, maior a probabilidade da nossa mente produzir também pensamentos relacionados com esses conteúdos.

Para além disso, as nossas emoções estão sempre presas aos nossos pensamentos. Ou seja, se pensamos em nos despedir de alguém de quem gostamos, sentimos tristeza. Mas, se nos recordamos de um abraço afetuoso de uma amiga sentimos contentamento ou gratidão. Há sempre uma congruência entre o que pensamos e o que sentimos.

Concluindo: ao enviesamento natural da nossa mente para o que é negativo, adicionam-se ainda as experiências negativas que, inevitavelmente, vamos tendo ao longo da nossa vida. De uma forma simplista, poderíamos dizer que quanto mais experiências negativas, maior a probabilidade da nossa mente produzir pensamentos (recordações do passado ou antecipações sobre o futuro) de acordo com esse conteúdo, e desses pensamentos resultarão também emoções/estados emocionais negativos, que por sua vez geram novamente pensamentos negativos.

E é assim que, em determinados momentos mais desafiantes da nossa vida, podemos cair numa espiral de ansiedade ou depressão…

O Mindfulness permite interromper este ciclo vicioso e trazer a atenção para o que está a acontecer no momento presente. Permite-nos “sair da nossa cabeça”, e ligarmo-nos à experiência que estamos a ter no momento, saindo dos ciclos de ruminação sobre o passado, ou de catastrofização do que aí vem no futuro, em que estamos muitas vezes à beira de cair….

A verdade é que o nosso pensamento, a nossa memória, a nossa capacidade reflexiva e o nosso raciocínio são características extraordinárias do ser humano, maravilhosas mesmo… que permitiram à nossa espécie resolver os mais extraordinários e desafiantes problemas ao longo da evolução. Mas se estas competências são fundamentais para a resolução de problemas no nosso dia-a-dia, são geralmente inúteis para nos ajudar a gerir os nossos estados internos, os nossos pensamentos ou emoções.

A nossa casa é geralmente o nosso refúgio, o sítio onde nos sentimos seguros, onde podemos descansar, e recarregar energias.

Assim, também o nosso corpo pode ser o nosso refúgio desta espiral de ansiedade e depressão em que podemos cair em momentos desafiantes da nossa vida. No nosso corpo podemos sempre confiar, ele nunca está enviesado, é portátil (está sempre connosco) e nunca está nem no passado, nem no futuro. O nosso corpo está exatamente onde nós estamos: no presente!

O corpo pode ser a nossa âncora para sairmos de dentro da nossa cabeça, dos nossos padrões automáticos, e trazermos a nossa atenção para onde ele está, ou seja, para o presente.

Em momentos desafiantes, em que nos sentimos assoberbados de emoções e pensamentos enrolados como num novelo de lã, em vez de insistirmos a tentar “resolver” o que estamos a sentir com a nossa mente (o que provavelmente só vai dar mais nós no novelo), podemos fazer um “check-in” no corpo e perguntar: “como é que o meu corpo está sentir isto neste momento?” “em que sensações físicas se traduz isto que estou a sentir?”. Pode ser um bom momento para fazer a Pausa dos 3 minutos de Respiração (ver como no artigo https://conscienciaplena.pt/2019/12/06/espaco-de-3-minutos-de-respiracao/), e ganhando mais consciência sobre o que está a acontecer consigo, e sobre o que está a acontecer à nossa volta, talvez seja possível escolhermos a melhor forma de responder à situação em que nos encontramos, em vez de lhe reagirmos automaticamente.

Diana Duarte

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